ENTREVISTA

Cláudio Aragão, o poeta bom de versos e de prosa

Cláudio Aragão nasceu no dia 13 de agosto de 1.957 no Sertão do Ceará. Em 64 deixou sua terra natal e veio para o Rio de Janeiro com a família, num caminhão pau de arara, em busca de melhores condições de vida. Viveu 5 anos no Complexo da Penha. Na maior parte de sua vida – entretanto – morou em Duque de Caxias. Lá, foi vizinho do famoso político Tenório Cavalcanti, conhecido como “o homem da capa preta”.

Há dois anos ele vive em Búzios, onde espera realizar seus projetos culturais. O poeta tem 15 livros publicados, dos quais se destacam as histórias do futebol em cordel.

Na primeira entrevista do Aldeia Cultural você vai conhecer o poeta bom de verso e de prosa, Cláudio Aragão. Até o dia 25 de agosto, 30 poemas seus fazem parte da Exposição “No Coração do Cordel”, que homenageia o centenário da artista Isa Aderne, no Espaço Zanine em Búzios.

Até o dia 25 de agosto você participa da exposição no Zanine, com 30 poemas de cordel. Como está sendo a interação com o público, sobretudo, os estudantes?

A primeira exposição a gente nunca esquece. (risos) É uma exposição que “bate no paladar” porque lida com o sertão, com a nossa raiz. Quinhentas pessoas já visitaram. Eu fiz questão de ir a algumas escolas, falei com os diretores: Olha eu tenho um trabalho lá de literatura de cordel com xilogravura. Isso é Nordeste, isso é Brasil. Quero que as crianças aqui de Búzios, do Rio de Janeiro saibam o que é isso. E a minha surpresa é que as crianças têm participado. As crianças vêm, uns atentos, outros menos atentos. Mas o importante é que a semente está plantada ali.

E como foi o processo da criação dos poemas para a exposição?

A ideia da exposição veio porque 1º de agosto é o Dia Nacional do Cordel. O curador Zé Antônio Mendes tem xilogravuras da Isa Aderne e falou pra mim da exposição de 100 anos da artista. Cordel e xilogravura têm tudo a ver: é corpo e alma, carne e unha. Então, pra cada xilogravura, criei um poema, utilizando técnicas diferentes da poética popular sertaneja: martelo agalopado, galope a beira mar, sextilha, redondilha maior, redondilha menor, poema livre…Assim posso mostrar essas diferentes formas para os alunos que vêm pra exposição.

Leia também: Exposição homenageia centenário da artista Isa Aderne

 

Você tinha comentado que escrever cordel é um ato de resistência. Você escreve pra resistir?

Sim.

Resistir a quê?

Existe algo chamado lixo cultural. Tem coisas boas e coisas ruins acontecendo, e a gente tem que saber separar. O lado ruim se apodera da sua raiz, da sua identidade. Você corre o risco de entregar a sua cultura. Resistência é isso. O folclore é resistência, o cordel também.

E como surgiu seu interesse pela escrita?

Sou retirante nordestino. Existem coisas que é difícil explicar. Quando criança trabalhei em feiras, obras, fábricas e 40 anos em restaurantes. Eu não me identificava com nenhuma dessas funções, apesar de ser famoso no mundo gastronômico. O dom chega aos poucos. Aos 19 anos fiz minha primeira redação com toques literários. Os professores elogiaram, incentivaram, mostraram aos colegas. Eu fazia o segundo grau Técnico em Contabilidade. Essa foi a primeira luz, e eu fui escrevendo… Em 1.980 entrei pra Faculdade de Letras Santa Úrsula pra entrar no mundo dos livros. Já sabia que era esse o caminho. Faltava-me a técnica. O fator determinante foi eu entrar na melhor Oficina de Literatura do Brasil. Fiquei lá 8 anos. Aprendi técnicas pra Poesia e Prosa, além de mergulhar no universo da literatura oral do Cordel, de meus ancestrais cearenses…enfim…Dom de Deus que não se explica, se cumpre.

Quais foram suas principais influências?

Eu vim do Nordeste aos 5 anos de idade num caminhão pau de arara e nunca mais voltei. Mas o meu sangue é nordestino. Daí eu ter enveredado para a literatura de cordel e unido o cordel ao futebol, que foi uma arte que aprendi a amar aqui no sudeste. Dessa junção criei uma coleção inédita: a história do futebol em literatura de cordel. Já tem a história dos clubes do Rio de Janeiro e do Corinthians e vai sair do Palmeiras e do Atlético Mineiro.

E sobre os escritores que te influenciaram?

Há alguns poetas de quem eu sempre gostei muito, como Vinicius de Moraes, Carlos Drummond de Andrade, Jorge de Lima. Mas Manuel Bandeira é o que mais me fascina, por ele trabalhar com a linguagem simples e profunda. Ele foi uma influência pra mim. Os de fora tem Camões, Fernando Pessoa e Bertolt Brecht, um cara resistente que fez teatro como ninguém. Outro escritor que me influenciou é Roberto Drummond, torcedor doente do Atlético Mineiro, autor de Hilda Furacão. Gosto muito dele quando escreve contos, tem dois livros maravilhosos “A Morte de D.J em Paris” e ”Quando fui morto em Cuba”. Ele pertencia à literatura pop, com uma escrita totalmente diferente.

Agora fale um pouco sobre seus livros.

O “Presente do Indicativo” (2012) e o “Anjo Feio” (91) são livros de poesia. Em 96 eu fiz meu primeiro livro em prosa, chamado o “Galo Preto e outras histórias”, são 48 histórias curtas, depois foi adaptado para teatro. Tem também a coleção das histórias da seleção brasileira e dos times de futebol em cordel. Escrevi também em versos logos a história do jogador de futebol Garrincha, no livro “Prosopopeias de Mané Garrincha” (2020) e “Baco em Versos – a literatura de cordel visita o maravilhoso mundo do vinho”(2010). Eu tenho 15 livros publicados e outros para publicar.

E os que você ainda não publicou?

Tenho uns quinze livros pra publicar, tenho produzido muito. Mas como boa parte dos escritores do Brasil, tenho dificuldade de achar o editor, conseguir o dinheiro… Então estou buscando alguém, algum agente cultural, pra poder ajudar nesse trabalho. Meus trabalhos são originais, são produtos bons de vender. Tem na fila pra sair três livros da coleção Futebol em Cordel: Flamengo, Palmeiras e Atlético Mineiro. Tem também a história de Búzios em versos, entre outros.

E onde dá para comprar seus livros?

Dos 15 livros publicados até agora, todos estão esgotados. Mas podem ser encontrados no Mercado Livre e Estante Virtual.

Pra finalizar, se você tivesse que “convencer” um jovem sobre a importância do cordel na cultura brasileira, o que você diria?

Eu acho que o cordel se renova. Veja bem o que está acontecendo agora, aqueles que estão começando a beber da água do cordel, da poética do cordel, que são as batalhas de rima. A batalha de rima está se espalhando. Então, muitos garotos que vêm aqui, eu falo: gente, vocês têm que ter um arsenal de palavras diferentes pra ganhar na batalha de rima. Veja o cordel, como é cada verso. A força é tão grande do cordel, do verso, que tudo se multiplica.

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